segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Crônicas do Tédio 01

Não era ainda nem seis horas da manhã quando, na inquietude de um sono turbulento, seus olhos encararam o teto iluminado pela luz dos postes na rua, que entravam pelas frestas da janela. O sol demorava pra nascer naqueles dias-todos-iguais de inverno. Uma hipnose terrível atormentada por pensamentos vagos de quem está cansado de pensar.

Sentia-se preso a cama. Sabia que precisava levantar, mas precisava reunir tantas forças, e não havia nenhum motivo que o encorajasse. Mais um dos dias-todos-iguais. Fazia tempo que não tinha um dos dias bons, e a lembrança destes dias servia tanto para reunir forças quanto para afundar-se cada vez mais numa personalidade estranha e taciturna.

Ficou lá, encarando o teto, até que o despertador começou a emitir seu som irritante. Foi a irritação que o fez levantar. Seis e meia, pensou, e apertou com vontade aquele objeto, cessando a sua emissão de sons enlouquecedores.

A seguinte descrição de fatos aparentemente inúteis não são tão inúteis assim, pois descrevem bem a terrível sensação de tédio e desânimo pelo qual estava passando. Pois, calçou seus chinelos, tão obsessivo-compulisvamente dispostos ao lado da cama. Levantou-se. Caminhou até a porta, de onde puxou a toalha de banho que por cima dela repousava. Dirigiu-se ao banheiro. Abriu o chuveiro.

O choque da água quando tocou seu corpo o fez despertar. Revisou seus planos para o dia em pensamento. Nada de diferente. Só mais um daqueles dias-todos-iguais.

Se assustou ao deparar por acidente com a sua imagem refletida no espelho embaçado do banheiro. Como sou patético, pensou ele, tentando desviar o olhar daquela imagem que refletia não apenas a sua aparência física, mas como ele se sentia por dentro. Mas, da mesma forma quando tentamos desviar o olhar de uma coisa desagradável, e no entanto, somos cada vez mais atraídos por impulso masoquista a encarar aquilo, ele não consegui desviar o olhar. Encarou fixamente seus próprios olhos, até que chegou a um nível em que a tristeza crescera tanto dentro do seu peito, se tornara palpável.

Bloqueou. Aliás, que artifício magnífico esse, de "bloquear" o que é desagradável! Mostra muito bem a natureza fraca humana, que ao mesmo tempo que é impelida a encarar o que lhe é desagradável, é também persuadida a simplesmente "bloquear" o que se torna incômodo, jogando aquilo para o seu subconsciente. Nós simplesmente deixamos de enxergar o óbvio para evitar problemas, situações difíceis e desagradáveis, tentando de uma maneira infantil manter um status quo que já se perdera há muito. E sempre nos esquecemos de que são justamente as dificuldades e problemas que nos fazem crescer.

Terminou de se arrumar, pronto para encarar mais um dia de tédio e marasmo. Tinha recuperado parte da sua harmonia pessoal falha e de sua resignação, quando o telefone tocou. Mal sabia ele que agora não haveria mais jeito de bloquear ou desviar o olhar. Os fatos que sucederam o forçaram a abandonar aquele status quo, e se lançar em algo diferente, que o mudaria de forma substâncial. Iria se tornar uma nova pessoa. E independentemente do caminho tortuoso e difícil que ele está prestes a tomar, ele jamais se arrependerá disso.

E é justamente dessa mudança sublime e avassaladora que iremos tratar nesta história.

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